QUANDO A VERDADE CONHECEU A MENTIRA , , |
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a imagem é composição de hh sobre "A Verdade saindo do poço" - 1896 Jean-Léon Gérôme - pesquise pelo original. | ||
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Quando
A Verdade Conheceu A Mentira Sim, na matemática, em tese, mas na vida real reta curva é
uma mentira equidistante da verdade. É curva ou é reta, porque uma reta não faz
curva, se o fizesse chamar-se-ia Curva... ou seja, dois + dois é igual a quatro.
Não cinco ou outro resultado, mas quatro.
A Verdade mais uma vez desconfiada põe a pontinha do pé na água, é, realmente está agradável e refrescante. Decide tirar suas roupas, entrar no poço e nadar onde a Mentira mais do que depressa já se havia despido e se jogado fazendo grande alarde de como a água estava maravilhosa.
A
Mentira chegou à Verdade sempre sorridente e festiva, Bom dia dona Verdade! E a Verdade foi
comprovar se realmente era um bom dia. Era realmente um lindo dia.
—
Bom dia, senhora Mentira.
—
Está muito quente hoje... – continuou a Mentira. De fato, a Verdade
vendo que a Mentira foi sincera, relaxou-se. A Mentira, então, a convidou para se
banharem em um rio ali perto. Tirou a roupa, pulou na água. — Nó!! que delícia! A Verdade sem hesitar
tirou suas roupas e pulou no rio, a Mentira na mesma hora saiu da água,
vestiu-se com as roupas da Verdade e saiu correndo.
A Mentira, vestida de
Verdade, fez sucesso. Foi ovacionada e glorificada por todo o mundo. Ganhou
cegos seguidores, devotos, fiéis, tietes e bilhões de curtidas por todos os
continentes. Foi violentada,
brutalizada e ridicularizada. Tratada como
grotesca, antissocial e desequilibrada foi expulsa das cortes, dos tribunais,
dos púlpitos, dos palcos, dos palanques, dos altares, dos lugares ricos e dos
lugares pobres, e por fim, foi expulsa dos corações. Então, chegamos a essa última versão da Verdade contra a Mentira e da Mentira contra a Verdade.
Todos ao vê-la, de imediato e como antes, lhe viravam as costas de vergonha, de ódio, de nojo, ou de medo. O mundo queria que a Verdade continuasse bem longe e enterrada. Ninguém lhe desejava boas-vindas. Ninguém deixava que entrasse em suas casas. Ninguém lhe oferecia um copo d’água. Assim, a Verdade percorreu os confins da Terra sempre criticada e rejeitada. Porém, numa tardinha bem ao pôr do sol, abalada e triste, encontrou a Mentira passeando alegremente em belos trajes esvoaçantes e brilhantes com vistosas joias e a face maravilhosamente maquiada numa elegância de dar gosto. Vendo a Verdade naquela situação quis saber o que se passava. — Verdade, amiga! Por que você está tão abatida? — Porque me sinto feia e antipática. As pessoas me evitam e me xingam tanto! — Que absurdo! – gargalhou a Mentira. — Não é por isso que as pessoas te evitam. Toma aqui. Veste minhas belas roupas e verás o que acontece! Então, a Verdade se montou com as lindas vestes da Mentira. Como num passe de mágica, da noite para o dia, passou a ser bem-vinda e festejada em todos os lugares. Agora é aclamada e respeitada. As pessoas se curvam ante a Verdade vestida de mentiras. É recebida por reis e pelo clero, juristas, delegados, generais, príncipes e princesas, amarelos e pretos, vermelhos, brancos e azuis. Todos passaram a adorá-la e a defendê-la com a própria vida se fosse preciso. E a Verdade voltou aos mesmos rincões da Terra por onde
antes fora desprezada e expulsa, só que agora travestida de ‘meias verdades’ ou
‘umas pequenas mentiras inofensivas’ foi abraçada e protegida. Andou por
pocilgas, senzalas, favelas, meretrícios, academias, templos, catedrais e
palácios suntuosos sempre bem recebida e amada.
A Verdade ficou ali por horas sentada na margem do grande
rio, ouvindo o som dos pássaros, do vento e do correr das águas a lhe tocarem
mansas e refrescantes o colo, as pernas e seus pés. Em silêncio, pensativa,
cabeça baixa, ar melancólico rabiscava com os dedos a superfície da água,
perdida em suas reflexões.
— Sabe o que agora andam falando sobre mim por aí? – disse a Mentira à Verdade erguendo os braços ordenando ao seu séquito que ficasse quieto e em silêncio. A Verdade estranhou aquilo. A Mentira sempre fora muito educada e gentil. Dizia sempre ‘Bom dia’ ‘Boa tarde’ Boa Noite’ ‘Por obséquio’ ‘Obrigada’ e ‘Com licença’. O que acontecera para que esquecesse os bons modos? — O que andam dizendo? — Cantam por aí em versos e prosas que eu tenho as pernas curtas! Você acredita nisso? Olha para as minhas pernas! A Verdade olhou as pernas da Mentira. Eram lindas e saudáveis. Maravilhosas. — Mas por que estão dizendo isso? — Posso te contar um segredo? – sorriu maliciosa a Mentira. — Eu mesma espalhei essa! kkkkk A Verdade a olhou espantada. — Mas por que você faria uma coisa dessas consigo mesma? — Para os tolos e ingênuos ouvirem dos maldosos e canalhas. Eles têm que acreditar que eu não posso ir longe!! kkkkkkkk A Verdade baixou os olhos mirando a água com tristeza. — Mas, e você? – perguntou a Mentira. — Por que ainda tem esse semblante taciturno? Esse olhar caído? Não é hoje tão amada e bem quista por onde passa? Todos não se ajoelham perante você e a idolatram como uma deusa? Por que está ainda tão insatisfeita? Estando mesmo desolada a Verdade se abriu. — É que vestida com suas roupas eu só atraio um tipo de gente. Eu, a Verdade vestida de mentiras, só atraio os Tolos, Ingênuos, Malfeitores e Canalhas! Ou seja, vestida com suas roupas eu só atraio os bobos e a escória! — E o que isso importa, minha querida? – disse a Mentira deslumbrada com o seu próprio sucesso. — São esses aí que me dão o poder! São esses que se arrastam em multidões atrás de mim! e me fazem ser a Rainha das Rainhas, a Deusa das Deusas da Deusa que eu sou!!! — Mas é justamente esse o tipo de gente que eu quero evitar. É essa gente que eu quero desmascarar e impedir que com suas atitudes continuem causando tanto mal ao mundo! Sinto muito Mentira, mas não posso continuar usando as suas roupas! — Pense bem no que você vai fazer! – ameaçou a Mentira. — Já me decidi! De hoje em diante nunca mais vestirei suas roupas! Toma pode levá-las! — O quê?!! Sua Ingrata!! – esbravejou a Mentira. — Você vai voltar a ser aquela coisa insignificante que era antes de me conhecer! Vai voltar a ser escorraçada em todo lugar e por todo o mundo! Aí quando você estiver de novo no fundo do poço, não me venha procurar porque eu não te ajudarei! Nunca mais!! Assim, a Verdade, após se lavar em águas cristalinas, abandonou de vez as roupas da Mentira e saiu pelo mundo sem se envergonhar de sua nudez, pois a nudez é a verdade natural do seu ser. Ela não mais se via infeliz, ridícula ou tola, se sentia viva e forte.
a imagem é a adequação de hh à censura de nús no Facebook, sobre a obra "La Vague - 1896 William-Adolphe Bouguereau" - pesquise pelo original.
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